O segredo do Hambúrguer de Siri e a objetificação do Conhecimento

Você já ouviu falar no Bob Esponja Calça Quadrada? Trata-se do protagonista da série de desenho animado homônima criada pelo biólogo marinho e animador norte-americano Stephen Hillenburg. Ao assistir alguns episódios pode-se perceber como seus personagens apresentam traços marcantes dos vícios e paradoxos da pós-modernidade.
Sirigueijo é o ícone do individualismo e da avareza. Proprietário da lanchonete Siri Cascudo, Sirigueijo oferece como principal e extraordinário produto o Hambúrguer de Siri, iguaria cuja fórmula é mantida em absoluto segredo.
Plâncton, pequena criatura que se intitula inimigo de Sirigueijo, é casado com um computador do qual é intelectualmente dependente (embora sua arrogância e narcisismo não lhe permitam perceber isto). Obcecado pelo poder, acredita que pode conquistá-lo roubando a fórmula secreta do hambúrguer de Siri.
Bob Esponja trabalha no Siri Cascudo e, aos olhos do patrão Sirigueijo, é um funcionário exemplar por seu compromisso e obsessão pelo trabalho. Seu principal lema é “Estou Pronto!". Junto com sua “amiga Spats”, uma espátula de cozinheiro, Bob Esponja é responsável pelo sigilo da fórmula e pela produção do extraordinário hambúrguer.
Inúmeros episódios da série revelam certa ironia em relação ao “segredo” do Hambúrguer de Siri. Afinal, o que pode existir de secreto em um hambúrguer? O “segredo da fórmula” realmente é a chave do sucesso financeiro do Sr. Sirigueijo?
Não posso afirmar que a pretensão do autor (ou da equipe de criação), ainda que subliminarmente, seja propor uma mensagem filosófico-crítica, mesmo porque é possível conjecturar que o Hamburguer de Siri é resultado de uma fusão irônica entre dois ícones da globalização econômica: a Coca Cola e o McDonald's.
Mas o que parece evidente é que a trama se desenrola a partir de uma premissa que há muito tempo insisto em desconstruir: a perspectiva preponderante do conhecimento objetificado. Os três personagens, Sirigueijo, Plâncton e Bob Esponja (especialmente os dois primeiros) reconhecem a “fórmula” (o conhecimento técnico para produzir o hambúrguer) como uma coisa, um objeto passível de apropriação individual. Ocorre que o predomínio desta visão nos distancia muito da percepção de conhecimento como processo, como fruto que subjaz das relações humanas, da comunicação e da linguagem.
Autores sistêmicos como Fritjof Capra explicam que, no século XXI, o pensamento Cartesiano pautado na especialização, na existência de verdades universais e na objetificação do saber será substituído pela visão dinâmica e contextual do Conhecimento. A partir do novo paradigma, o conhecimento é fluido e só existe em uma dinâmica relacional em rede.
Nesta perspectiva, não há segredo que se mostre apto a projetar o sucesso. Todo o conhecimento, a racionalidade e a criatividade que afloram da experiência humana não resultam apenas ou preponderantemente de habilidades psicomotoras individuais. Conhecimento não é “coisa” criada ou aprisionada na mente de “um”, ou algo que efetivamente possa ser “protegida” em um cofre. Não somos privados do conhecimento quando alguém “esconde” uma fórmula, mas quando nos distanciados da experiência comunicativa e da linguagem.
Em um mundo evidentemente materialista que insiste em enaltecer absurdamente o individualismo, a propriedade privada e o dinheiro como ideais de sucesso, é difícil que a maioria das pessoas se de conta da importância das relações humanas para o seu crescimento pessoal. É difícil despertar para valores que não podem ser precificados. Contudo, ainda assim acredito que vale a pena ter esperança. Acredito que a humanidade tem condições de virar o jogo, ainda que, por enquanto, o placar esteja dois a um para o adversário aos quarenta e dois minutos do segundo tempo.
Prof. Alejandro Knaesel Arrabal

16 de abril de 2014

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