Diversas vezes já ouvi alguém dizer "quem sabe tudo não sabe nada". Durante muito tempo concordei com esta afirmação. Na juventude fui educado a acreditar que, para ser alguém no mundo real - lugar que afirmavam existir para além dos muros da escola e do aconchego do lar - era imperativo especializar-se. Hoje coloco esta afirmação sob suspeita. Normalmente interpretamos que ”saber tudo" significa optar por conhecimentos generalistas e superficiais incapazes de conduzir a uma qualificação, a consolidar um saber de excelência. É justamente na contra-mão deste pressuposto, ou seja, na busca de um saber especializado, que muitos procuram a graduação e a pós-graduação.
Não é preciso ser um cientista ou filósofo para perceber que o ser humano não é dotado de qualidades ou recursos que lhe permitam ser onisciente. Aliás, o simples fato de imaginar esta possibilidade com base nos avanços da tecnociência é uma prova da dificuldade que temos em perceber qual é o nosso papel na existência. Não podemos negar: em maior ou menor grau somos individualistas e egocêntricos. Acreditamos acessar o mundo a partir de nossas singularidades e reconhecemos que isto seja um fato incontestável. "Cada cabeça uma sentença" não é assim? Pois bem, em geral somos imaturos e incompetentes para perceber o mundo a partir de pontos de vista diferentes. Sincretizamos a especialidade e a individualidade na lógica do "cada um sabe de si" e "dos meus problemas cuido eu". Esta postura fragmentária, típica do Especialismo individualista, compromete nosso presente e o nosso futuro.
Neste cenário, acreditamos que realizar um "trabalho de pesquisa em grupo", por exemplo, é simplesmente atribuir a cada integrante a tarefa de elaborar parte da pesquisa. No final, alguém juntará os fragmentos. Uma espécie de linha de produção que privilegia a celeridade, a eficiência e a noção de conhecimento objetificado. De certa forma, não é diferente da concepção de ensino seriado e disciplinas moduladas que ainda vigoram na educação formal. Atribuímos ao conhecimento idêntica qualidade dimensional que evidenciamos em objetos tangíveis, de modo que aceitamos sua fragmentação, transferência, replicação e cumulação. Assim, conhecimento é entendido como um "bem” (intangível), uma "coisa" que, embora não seja percebida diretamente pelos sentidos, é passível de apropriação individual. Infelizmente o predomínio desta visão oculta à perspectiva integrativa e humanista do conhecimento, ou seja, esquecemos que conhecer é desde sempre um fenômeno emergente de interação humana. Assim, antes de objeto o conhecimento é fenômeno integrativo, relacional. Não há conhecimento sem interação, sem relação comunicativa. Não há conhecimento sem linguagem.
O pensamento sistêmico denunciou a precariedade do Especialismo ao afirmar que o todo é algo diferente da mera soma das partes. Neste sentido, a atividade de pesquisa realizada em grupo deve ser conduzida para além de posturas fragmentárias que acreditam na possibilidade de produzir conhecimento a partir da mera soma de partes. Neste cenário há uma falsa percepção integrativa, já que a mera soma não evoca comunicação e, portanto, não é indutora do conhecimento. Não somos capazes de saber tudo, mas isto não significa que tenhamos que abrir mão de uma visão de mundo qualitativamente integradora, atenta aos reflexos e consequências decorrentes de fenômenos e ações aparentemente desconexos. A conquista da autonomia intelectual não se dá pelo isolamento ou sectarismo epistemológico. Ela é obtida a partir da percepção das relações e interdependências que nos constituem enquanto seres humanos.
Alejandro Knaesel Arrabal
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