A linguagem realmente é fascinante e desafiadora, especialmente quando pretendemos descrever com exatidão o que nós pensamos. Embora seja notório que as palavras possam assumir vários sentidos (pluralidade semântica), muitas vezes não nos damos conta disto. Palavras e frases apresentadas sem contexto conduzem equivocadamente a múltiplas interpretações, múltiplas “verdades”.
Fernando Pessoa (1969), em um de seus poemas, resgata uma célebre frase atribuída aos navegadores antigos: “Navegar é preciso; viver não é preciso.” Apresentada sem contexto, ou seja, isolada do poema ou mesmo sem que se saiba as circunstâncias que suscitaram a fala dos navegadores, surge uma inconsistência semântica em relação à palavra “preciso”, uma ambiguidade.
Preciso pode significar “necessidade” como também “exatidão ou certeza”, ou seja: “Navegar é necessário, viver não é necessário” para quem reconhece a navegação como uma atividade cuja relevância (social, econômica ou política) se sobrepõe a própria vida. Em outro contexto, pode-se considerar a navegação como uma atividade precisa, certa, desprovida de indeterminações, antítese da vida, por ser incerta, imprecisa, indeterminada em relação as suas circunstâncias.
Assim, o contexto determina o sentido. Fique atento a este aspecto da linguagem, seja em relação às fontes pesquisadas, seja em relação à produção do texto.
Mas o que realmente quis dizer Fernando Pessoa?
Leia o poema e tire suas conclusões:
Leia o poema e tire suas conclusões:
Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa: "Navegar é preciso; viver não é preciso."
Quero para mim o espírito desta frase, transformada a forma para a casar com o que eu sou: Viver não é necessário; o que é necessário é criar.
Não conto gozar a minha vida; nem em gozá-la penso.
Só quero torná-la grande, ainda que para isso tenha de ser o meu corpo e a minha alma a lenha desse fogo.
Só quero torná-la de toda a humanidade; ainda que para isso tenha de a perder como minha.
Cada vez mais assim penso. Cada vez mais ponho na essência anímica do meu sangue o propósito impessoal de engrandecer a pátria e contribuir para a evolução da humanidade.
Quero para mim o espírito desta frase, transformada a forma para a casar com o que eu sou: Viver não é necessário; o que é necessário é criar.
Não conto gozar a minha vida; nem em gozá-la penso.
Só quero torná-la grande, ainda que para isso tenha de ser o meu corpo e a minha alma a lenha desse fogo.
Só quero torná-la de toda a humanidade; ainda que para isso tenha de a perder como minha.
Cada vez mais assim penso. Cada vez mais ponho na essência anímica do meu sangue o propósito impessoal de engrandecer a pátria e contribuir para a evolução da humanidade.
Fernando Pessoa
Parodiando o poeta afirmo: simplesmente dizer não é “preciso”; é “necessário” contextualizar.
Prof. Alejandro Knaesel Arrabal
Referência
PESSOA, Fernando. Obra poética [em um volume] 3.ed. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1969. 842 p.
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